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Capítulo 7 [Parte 1] - Estudo sobre Amor e outros venenos letais

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Capítulo 7 [Parte 1] - Estudo sobre Amor e outros venenos letais

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Jan 26
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Capítulo 7 [Parte 1] - Estudo sobre Amor e outros venenos letais

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Olá para você que nos acompanha!

Agradecemos pela sua paciência e compreensão após a nossa pausa inesperada na semana passada, e agora retornamos à nossa programação normal!

Então que tal refrescar a memória sobre os acontecimentos dos capítulos passados?

Na primeira parte de Estudo sobre Amor e outros venenos letais, nós acompanhamos o reencontro de Aleksey com Morena e Ivan depois de quase DEZESSEIS MESES evitando-os, fomos apresentados à icônica Veronika Evaevna, alquimista, amiga de Morena e de Ivan (e de Aleksey, vai, depois do capítulo em que ela o consolou enquanto ele chorava); à Vladislav Olgaevich Poroshenko, o príncipe de Khostovinist', "namorado" de Aleksey e especialista em chegar no pior momento possível (você lembra, ele tem até um verbo dedicado a ele!!) e à Nadezhda Lyubovevna, esposa de Yakov e tia de Aleksey por tabela, que falou algumas coisas bem… interessantes para Morena no último capítulo.

Antes do recesso, os nossos três patetas protagonistas estavam um pouco mais desgraçados da cabeça do que o de costume, com Aleksey finalmente percebendo a extensão do que fez, Ivan abrindo seu coração até demais (mas a gente sabe o que ele realmente queria abrir 👀) e Morena cheia de ideia errada, que Nadya carinhosamente colocou na cabeça dela. Morena e Ivan terminaram o capítulo seis decidindo que precisavam de um tempo para respirar, decidindo dar um rolezinho na cidade mais próxima e talvez deixando Aleksey completamente maluco no processo…

O pobrezinho do Aleksey, nasceu para sofrer, né? Desumano! Não tem um momento de descanso na sofrência dele nem mesmo quando fazemos uma pausa. Espero que as coisas comecem a melhorar para ele, porque olha… 

Mas chega de lero-lero, vamos ao que interessa: é com muito prazer que venho anunciar que estamos de volta com a primeira parte do capítulo sete de…

Estudo sobre Amor e outros venenos letais!

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Gostou? Mal pode esperar pelo próximo capítulo? Você pode assinar o Catarse e receber um capítulo adiantado!

Perdeu algum capítulo? Não se preocupe, você pode ler as noveletters anteriores aqui ou acompanhar as publicações no Tapas ou no Wattpad.

Banner com fundo vermelho queimado com bordas trabalhada em linhas retas e douradas. No centro, um hexágono vermelho vivo, no qual saem linhas vermelhas e pretas para criar os bordados floridos que estão ao redor dele. No meio do hexágono, estão escritos o nome da autora e o título da obra: "Isabelle Morais" e "Estudo sobre Amor e outros Venenos Letais" (numa letra trabalhada em cursivo). À esquerda a logo da Noveletter.

Aviso: Esta obra contém/menciona comportamentos tóxicos, quadro depressivo, familiares abusivos e tentativa de homicídio. Algumas cenas deste capítulo contém insinuações de teor sexual e relacionamento de consentimento dúbio. 


Você pode saber mais detalhes sobre termos, apelidos e nacionalidades ficcionais, e outros personagens através do Guia de Leitura.



Era bom que ninguém da Corte nunca esperasse nada de Aleksey além de que proporcionasse risadas e comentários espirituosos, porque desde a conversa com Ivan, há quase dois dias, não conseguia pensar em mais nada. Ele também não vira o casal depois do ocorrido em canto nenhum — nem Ivan, muito menos Morena, que, depois do jantar de boas-vindas, parecia decidida a evitá-lo. Chegou a acreditar que Ivan decidira acompanhar a esposa naquela empreitada, mas quando percebeu que Veronika e a Condessa Zotov também não estavam mais participando de nenhuma das atividades, ficou se perguntando se haviam decidido ir embora, desistindo de continuar naquela farsa, para fazer algo mais produtivo. No caso, especialmente se haviam decidido ir para bem longe dele, levando as novas amigas junto.

Aleksey não os culparia se fosse o caso.

Por mais que tentasse, não conseguia se esquecer de Ivan com seu cabelo preto desarrumado e o rosto ligeiramente corado pelo sol e pela bebida, completamente vulnerável, sentado diante dele com as pernas cruzadas. Pensar na preocupação que Ivan demonstrara com a possibilidade de ter feito Aleksey chorar o fazia querer verter lágrimas de novo. Naquele momento, Aleksey finalmente percebera que Ivan se importava com ele, ao contrário do que havia acreditado por tantos anos. Nos últimos dias, se pegava relembrando momentos que na época achara que eram besteira e que decidira levar na brincadeira de uma forma completamente diferente. Os cuidados que Ivan tivera enquanto Aleksey se recuperava do tiro, os pequenos presentes que sempre tirava do bolso e lhe dava nos momentos mais inesperados, o esforço que empenhava em garantir que Aleksey e Morena estivessem alimentados e confortáveis o tempo todo, a determinação com que Ivan o ajudara para a prova antecipada de titulação como Extraordinário… Sentia vergonha de ter demorado tanto tempo para perceber, e agora que sabia pelo que procurar, tudo parecia óbvio.

Era claro que Ivan o considerava como amigo. Ivan não concedia seus sorrisos e gargalhadas a qualquer um, nem compartilhava as piadas e pensamentos, muito menos oferecia presentes e sua atenção. E mesmo assim, não era igual. O ciúme que ele sentira de Veronika parecia bobo, pequeno, depois daquela conversa que o levara a perceber que a única pessoa que ele tratava do mesmo jeito que tratava Aleksey era Morena.

Tudo que parecera misterioso e indecifrável subitamente ficara claro e direto. Todas as ações de Ivan que sempre o confundiram eram fruto óbvio de um fato inegável, declarado pelo próprio Ivan: ele queria Aleksey. Não só ele, mas Morena também. Saber isso tornava toda a situação ainda pior e Aleksey não conseguia parar de se sentir culpado. Sempre achou que sua ausência não faria diferença alguma na vida dos dois, que seria apenas uma mera lembrança, algo irrelevante, uma nota de rodapé na história de Morena e Ivan, de Ivan e Morena. Na imaginação de Aleksey seria fácil, porque Ivan seria pragmático e convenceria Morena rapidamente de que não fazia diferença alguma conviver com Aleksey. Ela não sentiria falta de nada depois de um tempo porque, francamente, o que ele tinha para oferecer para ela? Para Ivan e Morena? No fim, ficariam bem, seguros e felizes, porque tinham um ao outro. Não seriam mais alvo de Yakov só por estarem perto de Aleksey. Tudo resolvido em uma tacada só.

Só que talvez estivesse sendo tão difícil para eles quanto era para Aleksey. Talvez a história de Morena e Ivan tinha espaço para mais um nome ali, entre eles.

O toque quente de Laszlo na pele de Aleksey o trouxe de volta dos devaneios, o rosto preocupado do homem próximo ao seu com uma expressão de quem já o chamara algumas vezes.

— Alex, está tudo bem? Você quer voltar para o quarto? — sussurrou ele, entrelaçando os dedos nos de Aleksey.

A pele áspera de Laszlo contra a sua era como uma âncora, trazendo-o de volta para a realidade. Aleksey piscou algumas vezes, percebendo que estavam em um salão de jogos com a parede coberta de placas de madeira, sentados no canto mais remoto. Na mesa mais próxima, um grupo de quatro pessoas jogava baralho enquanto gargalhava alto e fumava, e uma das mulheres fez um gesto para um garçom que passava servir mais uma taça de champanhe. Aleksey demorou um tempo considerável para se situar, as roupas cheias de penas e de babados e ouro ao redor, parecendo saídas de uma alucinação, as máscaras e fantasias se transformando em seres oníricos com a fumaça densa do cômodo em que se encontravam. Olhou para o tapa-olho no colo e para o cigarro nos dedos que não lembrava de ter acendido, sem entender a roupa antiquada e extravagante que vestia. Se perguntassem para ele como fora parar ali, ele não saberia responder.

— Eu acho que você precisa tomar um ar — continuou Laszlo, pegando o cigarro da mão de Aleksey com cuidado e apagando-o em um cinzeiro de cristal. — Vamos dar uma volta nos jardins?

Aleksey assentiu, aceitando a ajuda de Laszlo para se firmar de pé e então atravessaram o salão de braços entrelaçados, oferecendo gracejos que saiam sem esforço algum para os conhecidos, apenas seguindo o fluxo. Ele entendia agora onde estavam: era a penúltima noite da festa, o dia do baile à fantasia, que acontecia a todo vapor, praticamente em seu ápice, quase todos os convidados já presentes, a bebida voando das bandejas dos garçons como água no deserto. Em um dos cantos, um quarteto de cordas se posicionava em um palanque, sinal de que logo iriam começar as danças.

Prometera para Laszlo que estaria melhor até aquele momento, mas talvez estivesse pior do que nunca. O coitado deveria estar se sentindo extremamente culpado de ter insistido para que comparecessem, ou pior, deveria estar preocupado com Aleksey. Aleksey parou um instante, o homem ao lado acompanhando o movimento. Laszlo franziu a testa em confusão e Aleksey apertou a mão dele com mais força, erguendo o rosto para beijá-lo.

— O que foi? — Laszlo perguntou, colocando uma mecha do cabelo de Aleksey que escapava da bandana na cabeça usando atrás da orelha. — Você está bem?

— Eu só estou feliz que você está aqui comigo — disse Aleksey, sorrindo para o outro.

Laszlo sorriu de volta, beijando a palma da mão de Aleksey.

— É um prazer estar com você, Alex.

Era a segunda vez que Laszlo falava algo naquele sentido só durante aquela viagem e, com as palavras de Ivan ainda ecoando na mente, começava a acreditar que era verdade. Ele sempre achava que era brincadeira quando diziam algo como aquilo, que a pessoa estava tentando agradá-lo, que na primeira oportunidade virariam contra ele e o largariam. Mas talvez Laszlo também gostasse de estar perto dele, mesmo com todos os problemas e questões que vinham de brinde, mesmo com todas as complicações que ele representava, mesmo sabendo que Aleksey não poderia retribuir inteiramente o que ele sentia, não naquele momento. Talvez Laszlo só gostasse da presença dele. Era uma ideia tão esquisita que Aleksey sentiu vontade de sair correndo e nunca mais olhar na cara de Laszlo.

Laszlo continuou a conduzi-lo pelo salão de baile, navegando a exuberância de plumas e brilhos, as fantasias dos convidados oscilando das mais simples e menos inspiradas até as mais espalhafatosas, alguns usando máscaras para se misturarem com a multidão e passarem despercebidos. Aleksey normalmente se divertia observando as figuras que se esgueiravam para os cantos para conspirar entre si, e sempre saía daqueles eventos com informações que se provariam úteis, mas, naquela noite, estava se sentindo muito distante do normal. A mão de Laszlo na cintura parecia ser a única coisa impedindo-o de se refugiar nos seus pensamentos mais uma vez, e quando foram interrompidos por um dos lacaios da Condessa Medinikov, vestido com uma libré com o brasão da família, Aleksey sentiu um nó no estômago.

— Príncipe Poroshenko? — perguntou o homem, aproximando-se discretamente, e Laszlo assentiu. — A Condessa Medinikov pediu para que eu o chamasse, há uma questão urgente que precisa de sua presença.

— Urgente? — Laszlo franziu a testa.

— Sim, um mensageiro acabou de chegar de Zhelezo com uma carta e se recusa a falar do assunto até que esteja em sua presença. — O lacaio olhou por cima do ombro, parecendo ligeiramente aflito. — Diz que o senhor precisa ir encontrá-lo o mais rápido possível. Infelizmente não posso adiantar o assunto, mas se me seguir, poderá conversar diretamente com ele.

Aleksey trocou olhares com Laszlo. Vindo de Zhelezo, havia três alternativas: um grande acidente, um desastre natural ou um acidente envolvendo Kalina, a sobrinha de Lazlo. Ele sentiu um calafrio ao pensar na última hipótese. Para que o lacaio estivesse ansioso dessa forma, deveria ser algo gravíssimo. Apertou a mão de Laszlo, apreensivo. A ideia de que algo ruim tivesse acontecido com a menininha que sempre o recebia com um sorriso cheio de janelinhas e um abraço apertado quase o fazia desejar que fosse apenas mais uma das armações de Nadezhda e de seu tio, um subterfúgio para deixá-lo sozinho e vulnerável durante o baile, mas era gratuito e óbvio demais. Não era muito o estilo de Nadezhda.

— Certo. — Laszlo pareceu um pouco sem jeito. — O Príncipe Barabash pode nos acompanhar?

— Sinto muito, mas o mensageiro falou que era de natureza particular. — O homem olhou para Aleksey com um pedido de desculpas silencioso.

— Pode ir — disse Aleksey rapidamente. — Eu vou ficar bem.

— Tem certeza? — Laszlo voltou o olhar para Aleksey, franzindo a testa.

— Absoluta. Vá encontrar o mensageiro. Parece ser importante.

Laszlo se despediu com um beijo gentil na bochecha de Aleksey, parecendo um pouco receoso de abandoná-lo ali. Aleksey apertou a mão novamente para reconfortá-lo e Laszlo por fim suspirou e seguiu o lacaio. Ele sempre gostava de observar Laszlo falando com outras pessoas, à distância, tão atencioso e cuidadoso com seja lá quem fosse, independente de posição social. Laszlo balançou a cabeça algumas vezes, ligeiramente inclinado na direção do homem que os abordara, claramente interessado nas respostas que recebia para suas perguntas. Antes de desaparecer por uma das portas laterais, ele olhou para trás, procurando por Aleksey, e acenou uma despedida. Aleksey respondeu com um sorriso, suspirando pesadamente assim que ele partiu, sentindo um aperto no peito.

Era melhor não pensar demais no que poderia ser o chamado ou no turbilhão de sentimentos conflitantes que eram sempre atrelados a Laszlo. Aleksey analisou seus arredores, percebendo que em um grupo próximo, a Baronesa Antonenko conversava às gargalhadas com um grupo de mulheres da baixa nobreza; à direita, a Condessa Kapiani de Okro se abanava com um leque de Xenon, usando as mesmas roupas que a avó de Ivan usava diariamente como se fossem uma fantasia, sussurrando intrigas no ouvido do marido do Conde Pushkin. Havia dezenas de rostos conhecidos, mas Aleksey não fazia ideia de onde ir ou do que fazer agora que Laszlo partira.

Aleksey escolheu se recostar numa das paredes do salão, esperando que sua fantasia de pirata lhe concedesse alguns minutos para tentar organizar os pensamentos antes de alguém o reconhecer e puxá-lo para uma conversa. Pegou uma taça de espumante de um garçom que passava, os olhos ainda buscando por algo na multidão, e encontrou Veronika e a esposa. As duas estavam vestidas com roupas antigas, coisas que haviam sido moda quase duzentos anos antes, quando o estilo da Corte ainda era muito próximo às vestimentas das alquimistas. Veronika usava uma calça preta e larga e um khalat vermelho que ia até seus joelhos, preso por um cinto grosso, lembrando a guarda de honra da Imperadora. A Condessa Zotov também estava no tema militar, com um khalat preto bordado em dourado com o padrão que era usado para comemorar uma grande conquista, que provavelmente estava na família dela há gerações. Apesar de ambas estarem muito bonitas, não combinavam muito com o resto da festa e não pareciam se importar. A esposa de Veronika a rodou em uma pirueta em um momento nada apropriado da dança e as duas riram quando voltaram aos passos normais, Veronika ficando na ponta dos pés para beijá-la.

Aleksey desviou o olhar, constrangido, como se tivesse invadido algo muito particular, e quando virou a cabeça, foi atraído quase imediatamente para outro casal que destoava de todos os outros, como se fosse a lua cheia numa noite sem estrelas.

Em uma fila de nobres de Argon, Morena e Ivan naturalmente já se destacariam. Morena tinha a pele mais escura do que qualquer outro presente e os olhos grandes, cílios longos e cheios e as sobrancelhas bem marcadas que herdara do pai eram escassas em Argon. Ivan também era notavelmente diferente, com as bochechas altas, o nariz reto, os olhos estreitos e o cabelo preto liso e pesado, a pele no mesmo tom da neve fresca refletindo o sol da manhã, completamente diferente dos rosas e beges que dominavam a nobreza do país. Aleksey sabia como era difícil para os dois se misturarem, sabia como tentavam de todo jeito não chamar atenção para si, mas naquela noite, parecia que queriam o oposto.

Morena trajava um vestido azul-escuro bordado com detalhes prateados que reluziam as luzes das lamparinas, que a envolvia e se transformava em uma capa pendurada por um dos ombros, como se estivesse vestida com a própria noite, que a seguia por onde andava. Seu cabelo cacheado estava preso no alto da cabeça com uma tiara que lembrava uma águia e os capacetes que o exército de Tantalum usava em batalha, e um colar que parecia ser feito com dentes de algum animal selvagem. Ao lado dela, Ivan estava com um khalat de seda verde-escura, em um modelo não muito diferente do uniforme que as alquimistas usavam, a túnica descendo até a metade das coxas. Também usava uma capa presa em ambos os ombros, o tecido verde bordado parecia ser feito de folhagem. Em vez de algo imponente como Morena, usava uma coroa de flores na cabeça, e havia um par de braceletes dourados nos pulsos, com uma corrente pendendo de cada um deles.

Aleksey provavelmente era o único ali capaz de reconhecer a fantasia de imediato: a deusa Manat e o seu primeiro e mais amado marido, Hubat, personagens de uma das histórias centrais da mitologia dos povos de Tantalum e dos aishin. Lembrava perfeitamente de Rahim, pai de Morena, contando aquela história em uma noite de lua nova na viagem que ele fizera a Tantalum para o festival de Najma, cujo objetivo era celebrar as três deusas que eles veneravam. A lenda dizia que Hubat, o deus da lua e da magia, da fertilidade e da chuva, havia sido sequestrado pelos sacerdotes ambiciosos de um império vizinho, que queriam tirar dele o segredo da imortalidade. Manat, a deusa do sol e da guerra, do amor e dos venenos, se enfurecera, mas era misericordiosa, então deu três chances para que devolvessem seu marido. No entanto, os sacerdotes, em sua arrogância, a desobedeceram. Então ela queimou a terra até não sobrar nada, até tudo virar um deserto de pedra e areia, em que nada pudesse florescer, até devolverem seu marido e pedirem perdão pelo que haviam feito.

Os outros podiam até não conhecer os detalhes da história, mas Ivan e Morena pareciam deuses caminhando entre mortais, e a mensagem de que eles eram perigosos era clara o suficiente.

A mensagem de que eram lindos era igualmente evidente.

Ivan levou uma mão para o meio das costas de Morena, por baixo da capa, e se inclinou na direção da esposa com uma expressão séria, os lábios quase encostando no ouvido dela. Ela virou o rosto o suficiente para Aleksey conseguir vê-la mordendo os lábios e arrumando o cabelo, claramente segurando uma risada, e ele sentiu seu coração afundar no peito. Como queria estar perto deles, saber o que Ivan dissera que havia feito Morena rir, como queria fazer piadas com a fantasia extravagante dos dois enquanto apreciava o quanto os trajes os deixavam incríveis. Como ele gostaria de observá-los de perto, pensando em como seria bom se ele só pudesse se ajoelhar e adorar os dois como se fossem deuses de verdade.

As primeiras notas de uma valsa soaram no salão e Aleksey parecia enfeitiçado, incapaz de desviar o olhar de Morena e Ivan, que haviam se deslocado para o meio do salão. Era incapaz de parar de olhar e pensar e desejar e, pela primeira vez desde o dia em que Morena puxara conversa com Aleksey em uma aula qualquer, quando tinham catorze anos, não havia nem resquício de culpa naquele pensamento. Não importa o jeito, Ivan dissera. Não importava que Aleksey estivesse imaginando como seria estar no meio do salão com eles, Morena imprensada entre o corpo dele e o de Ivan, e Aleksey pudesse explorar o corpo dos dois discretamente, a possibilidade de perceberem tornando tudo ainda mais excitante. Não importava que a mente dele o levasse ainda mais longe — para uma possibilidade nos jardins, os três juntos, os lábios de Ivan contra o ouvido de Aleksey, que mordiscava o pescoço de Morena, os quadris dela roçando contra os dele, pressionando-o contra o corpo de Ivan.

Ivan, Morena e Aleksey.

Aleksey passou uma mão no rosto e se virou para a parede para ajeitar discretamente a calça, que de súbito se apertara, o rosto queimando com a vergonha de ter uma reação tão corporal, como se fosse um adolescente descontrolado. Ainda estava se reprimindo quando sentiu uma mão tocando suavemente suas costas e se virou, com a esperança patética de que fosse Morena. Ou Ivan. Ou os dois.

Em vez disso, era outro casal parado ali: uma mulher loira de rosto fino e pele branca leitosa, parecendo uma ratinha, com um vestido cheio de plumas e penas brancas, fantasiada de pomba e um homem igualmente branco e loiro, de rosto largo, vestido como um pavão, com direito a uma tiara com penas da ave. Eram Inessa e Valentin Zuzkin; ela, uma condessa subordinada aos Barabash, ele, seu marido, vindo de uma família da pequena nobreza irrelevante o suficiente para que ele escolhesse trocar o sobrenome pelo da esposa, juntos, um dos maiores erros que Aleksey já cometera. Aleksey sentiu o estômago se revirar e deu um passo para trás, batendo as costas contra a parede.

— Que prazer encontrá-lo aqui, Alyoshenka — disse Inessa, se inclinando para dar dois beijos demorados e úmidos nas bochechas. Aleksey precisou se controlar para não limpar o lugar onde ela tocara, a repulsa quase como uma coisa viva escalando sua garganta. — Estávamos nos perguntando se você daria o ar da sua graça nesse evento, não é mesmo, Valya?

— Até nos perguntamos se você tinha decidido ir embora mais cedo — comentou Valentin, cumprimentando Aleksey com beijos ainda mais demorados depois que a esposa, e se posicionou à direita de Aleksey. — Sentimos sua falta imensamente esse verão inteiro. Não acredito que Poroshenko esteja exigindo que você seja só dele agora, ele nunca foi egoísta antes.

— As coisas não são tão boas sem você. Estamos com saudades. — A mulher fez um biquinho, aumentando ainda mais o toque ao entrelaçar o braço com o de Aleksey. — Se for preciso, podemos te ajudar a fugir do cativeiro. Qualquer coisa para o nosso inigualável Alyoshenka.

Aleksey engoliu em seco, completamente desconfortável com a insinuação de que Laszlo tinha qualquer coisa a ver com o incômodo que sentia quando estava com aqueles dois. O relacionamento de Lazlo e Aleksey sempre foi e continuava livre, e Laszlo tinha pelo mais dois parceiros fixos além de Aleksey; ele nunca teria um sentimento mesquinho com algo daquele tipo.

— É sempre bom te ver no meio de tanta gente feia, é um alívio para os olhos — disse Valentin e ele e a esposa riram.

Aleksey pensou em responder, mas Inessa passou uma mão pelo cabelo dele e ele ficou petrificado, e quando ela pressionou o corpo ainda mais contra o seu, ele tentou se afastar, batendo contra Valentin, que aproveitou a oportunidade para segurá-lo pela cintura. Aleksey deu um suspiro, fechando os olhos e juntando forças para tentar se livrar do casal, tentando pensar em qualquer desculpa, porque se não fizesse algo logo, era certo que acabaria no quarto deles. Eles nunca davam abertura de dizer não, de deixar que Aleksey falasse o que queria, bombardeando-o com toques e insinuações, encurralando-o até chegar em um ponto que ele se sentia tão constrangido e coagido que não conseguia mais ir embora. Já acontecera diversas vezes antes, ele sabia muito bem a estratégia daqueles dois.

— Eu estava… — Aleksey tentou falar, mas o casal se aproximou ainda mais, pressionando os corpos contra o dele a ponto de Aleksey conseguir sentir a respiração quente de Valentin contra seu pescoço.

— Nós soubemos da sua mãe, um caso horrível, muito triste — disse Inessa num tom que indicava que não poderia se importar menos com aquilo, acariciando o cabelo de Aleksey como se ele fosse um animalzinho. — Entendo não estar com a mesma disposição de sempre, as pessoas não têm noção alguma e não respeitam nossos momentos. As fofocas são horríveis, uma pior que a outra! Ninguém nessa corte consegue respeitar a dor alheia.

— A minha mãe…? — perguntou Aleksey, completamente desnorteado.

O perfume forte de Valentim unido à pressão dos corpos contra o seu, que já estava sensível, o deixou ainda mais confuso. Sem falar na valsa, tocando ao fundo, que entoava a toda a altura e o burburinho das pessoas e o calor do salão… Era coisa demais acontecendo ao mesmo tempo para conseguir reagir.

— O caso de maus tratos no hospício? Alguns até dizem que foi você mesmo que ordenou que a machucassem. Mas nós sabemos que você nunca seria capaz disso, não se preocupe — explicou Valentin, como se aquela insinuação fosse o que mais o preocupava.

Aleksey franziu a testa, com um milhão de perguntas sobre como aquela história se distorcera assim. Os dois eram fofoqueiros de primeira, não duvidava que tivessem inventado essa fofoca e espalhavam por aí. Ele não podia deixar que uma história como aquela circulasse pela corte, era perigoso demais. Precisaria dar um jeito de descobrir os próximos boatos antes mesmo que surgissem.

Porém, todos seus pensamentos se dissiparam quando Valentim desceu a mão para a sua bunda de Aleksey, enquanto a esposa descia uma mão pela sua barriga.

— Não importa, nós vamos cuidar de você — sussurrou Inessa no ouvido dele. — Nós podemos fazer você esquecer de tudo, sabe… Te dar exatamente o que você quer.

Aleksey fechou os olhos, afundando mais contra a parede sem ter uma rota de fuga. Na primeira vez que aceitara o convite dos dois, há quase um ano, ele estava meio bêbado e em um poço de lamentação e ódio de si mesmo. Só queria esquecer da sua vida e de quem era por algumas horas, e o casal parecia oferecer exatamente isso. E não fora exatamente uma experiência ruim, mas a sensação de que Aleksey não passava de um brinquedo para os dois aumentara depois e ele passara duas semanas se sentindo um lixo. Na segunda e na terceira vez, confirmara que não faria diferença se o substituíssem por um objeto fálico qualquer ou por literalmente qualquer outra pessoa, e Aleksey se perguntara, nas duas vezes, por que ainda estava se submetendo àquilo. Eles diziam que Aleksey era insubstituível, mas a verdade era que ele era o único que tinha sido burro o suficiente para cair na armadilha. Na quarta e na quinta, eles o encurralaram de forma que ele não conseguiu recusar, com indiretas e histórias a respeito dele que diziam ter ouvido por aí, munidos de ameaças implícitas de que contariam para todo mundo os absurdos que falavam, e aparentemente queriam que a sexta seguisse o mesmo padrão. Ele sempre se sentia horrível perto dos dois, como se não valesse nada, um homem completamente patético que nem conseguia se defender e tinha medo demais do que poderiam fazer ou inventar, de como reagiriam ao serem rejeitados por Aleksey.

Antes, Ivan e Morena o teriam ajudado. Ele se sentiria mais seguro, porque sabia que eles nunca permitiriam que algo acontecesse com ele, porque Aleksey tinha forças para reagir e responder, sabendo que alguém o acolheria depois das consequências. Antes, ele sequer teria se aproximado dos Zuzkin, porque ainda teria um mínimo de respeito próprio e algum tipo de critério quanto a quem ele levava para a cama.

Mesmo agora, sabia que se Laszlo estivesse ali com ele, o casal não se atreveria a se aproximar e ele não precisaria passar por aquela situação. Aleksey sentia vergonha só de imaginar o que Lazlo pensaria se soubesse a história inteira, com todas as nuances, mas sabia que, no fim das contas, bastaria Aleksey dizer uma palavra e Laszlo não deixaria que aquilo seguisse adiante.

As palavras de Ivan voltaram à sua mente: você não pode viver sozinho, nem brigar essa briga só.

— Eu tenho certeza que Poroshenko sozinho não dá conta de você…

Aleksey pelo menos teve a coragem de impedir a mão de Inessa antes de chegar onde ele não a queria, e ela arregalou os olhos, surpresa. Então franziu a testa, irritada e confusa, a fúria clara no olhar.

— Eu tenho um outro compromisso no momento — disse Aleksey, fraco, a sensação de que estava completamente sozinho mais forte do que nunca. Ele tinha outro compromisso onde? Com sorte, reencontraria Veronika na multidão e ela o ajudaria, mas ela estava tão entretida com a própria esposa que Aleksey não queria atrapalhar. Ele afastou a mão de Inessa e se desviou de Valentin o máximo que conseguia no espaço apertado, e continuou mesmo quando sentiu os dedos do homem segurarem seu colete. — Infelizmente não posso…

— O que pode ser mais importante do que a gente, Alyoshenka? — perguntou Valentin, o tom carinhoso manchando pela irritação e a arrogância.

— Eu sou.

Continua…

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CRÉDITOS

Autora: Isabelle Morais
Edição: Laura Pohl e Val Alves
Preparação: Laura Pohl
Revisão: Bárbara Morais e Val Alves
Diagramação: Val Alves
Título tipografado: Vitor Castrillo

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A próxima Noveletter, com a segunda parte do sétimo capítulo de Estudo sobre Amor e outros venenos letais, sairá no dia 02/02.

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